terça-feira, 29 de outubro de 2019
quinta-feira, 17 de outubro de 2019
A imunidade religiosa e as lojas maçônicas
1. Introdução
O texto constitucional prevê a imunidade
religiosa para os templos de qualquer culto, desonerando-os de impostos sobre o
patrimônio, a renda e os serviços.
Nessa medida, entende-se que
deve prevalecer a intributabilidade dos templos, que passarão ao largo da
incidência de impostos como o IPTU (sobre o local destinado ao culto e seus
anexos), o IR (sobre as rendas, dízimos e espórtulas), entre outros, desde que
relacionados às suas finalidades essenciais.
É evidente que o conceito de
“templo” mostra-se aberto ao intérprete, que deverá perquirir, à luz da
jurisprudência e doutrina, a exata extensão semântica do termo, separando a
benesse razoável daquela proteção desproporcional.
Daí surgirem questionamentos
pertinentes que povoam o tema e que nos instigam a enfrentá-lo em análise
detida: “conventos são templos?”; “cemitérios são templos?”; “o bem imóvel, de
propriedade do templo, locado a terceiros é templo?”; “as lojas maçônicas são
templos?”; entre tantos outros.
Conquanto tenha tratado da
investigação de tais temas alhures[1], ater-me-ei ao último questionamento no
presente artigo.
2. A imunidade religiosa e
a previsão constitucional
A imunidade dos templos, também
denominada “imunidade religiosa”, está prevista na alínea b do inciso VI do art. 150 da Carta Magna:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias
asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal
e aos Municípios: (...)
VI – instituir impostos sobre:
b) templos de qualquer culto; (...)
De início, é importante frisar
que o Brasil é um país majoritariamente católico, porém laico (ou leigo), isto
é, um Estado que não professa, desde a Proclamação da República, uma dada
“religião de Estado”, dita “religião oficial”. O fato de sermos um Estado laico
não significa que deixamos de ser “teístas”. O Preâmbulo do texto constitucional indica que entre nós
subsiste a crença na existência de Deus e em Sua ação providencial no Universo.
No Brasil republicano, a
religião de Estado, que até então permanecia, cedeu passo a um Estado “de
religiões”, ou seja, a um Estado não confessional, à semelhança da maioria dos
países espalhados pelo mundo.
No plano do Direito
Comparado[2], impende registrar que os países tendem a proteger e a estimular a
fé dos cidadãos, afastando a tributação das igrejas e, de modo reflexo,
incentivando sua proliferação.
Nos Estados Unidos, há
desoneração por meio de legislação ordinária, na forma de isenção, haja vista
não se ter desenvolvido por lá a teoria das imunidades; na Alemanha, as
entidades religiosas são consideradas “corporações de direito público” (Constituição, art. 140),
entretanto subsiste o “imposto eclesiástico” (Kirchensteuer), todavia o
Estado subvenciona as igrejas; no Uruguai (Constituição/1996, art. 5º), há
regra desonerativa para todos os impostos; no Chile (Constituição/1981, art.
19, § 6º), os templos ficam livres de toda classe de contribuições.
Voltando ao Brasil Pós-Império,
sabe-se que no período que mediou a proclamação da República e a Carta Magna de 1937, a intributabilidade das
religiões se deu por meio de legislação ordinária e, somente com o advento
da Constituição Federal de 1946, a não incidência
ganhou a estatura constitucional[3].
É nesse contexto que exsurge a
atual norma imunitória, constante do art. 150, VI, b, CF, no bojo da laicidade, cujo teor prevê a
desoneração de impostos dos templos de qualquer culto.
Vale destacar, em tempo, que o
elemento teleológico que justifica a norma em comento atrela-se à liberdade
religiosa (art. 5º, VI ao VIII, CF) e à postura de “neutralidade ou
não identificação do Estado com qualquer religião” (art. 19, I,
CF)[4].
Dessarte, a liberdade religiosa
significa que o cidadão poderá professar a fé, no culto e templo que lhe
aprouverem, ou, ainda, não devotar preces a nenhuma religião, em livre
escolha[5]. Esse modo de pensar, que pode ser intitulado de laicismo ou secularismo, veio
dar espaço no texto constitucional ao pluralismo
religioso, na seara das religiões, corroborando o Estado de Direito, que
prima pela necessária equidistância entre o Estado e as Igrejas, servindo como
“um dos pilares do liberalismo e do Estado de Direito”[6]. A
laicidade implica que, havendo privilégio, todos os templos devem dele
usufruir.
Na temática da desoneração em
decorrência da imunidade, diz-se que esta prevê a intributabilidade das
religiões, como um direito fundamental, afastando dos templos os impostos,
independentemente de fatores extrínsecos, v. G., a extensão da
igreja ou do seu número de adeptos.
Ademais, a imunidade para os
templos de qualquer culto trata do desvencilhamento de impostos que
possam recair sobre a propriedade, a renda e os serviços adstritos ao
patrimônio da entidade. Nessa medida, não estão exonerados os demais tributos,
diversos dos impostos, que terão a normal incidência, porquanto, “uma vez
que o texto constitucional fala em ‘impostos’,
relaciona-se ao fato de tal imunidade (...) não se aplicar ‘às taxas, à
contribuição de melhoria, às contribuições sociais ou parafiscais e aos
empréstimos compulsórios’”[7]. Esse tem sido, de há muito, o
pensamento emanado da jurisprudência doméstica[8].
Posto isso, a exoneração em
tela visa afastar os impostos dos templos de qualquer culto, que se mantêm
suscetíveis à tributação de outros gravames tributários[9].
3. A imunidade religiosa e
os conceitos de culto e templo
Para a compreensão exata do
alcance da imunidade religiosa, o estudioso deve, preliminarmente, delimitar os
conceitos de culto e templo.
Em breve incursão conceitual,
afirmamos que culto é a manifestação religiosa, cuja liturgia
adstringe-se a valores consonantes com o arcabouço valorativo que se estipula,
programática e teleologicamente, no texto constitucional.
Assim, o culto deve prestigiar
a fé e os valores transcendentais que a circundam, sem colocar em risco a
dignidade das pessoas e a igualdade entre elas, além de outros pilares de nosso
Estado. Com efeito, é imprescindível à seita a obediência aos valores morais e
religiosos, no plano litúrgico, conectando-se a ações calcadas em bons costumes
(arts. 1º, III, 3º, I e IV; 4º, II e VIII, todos da CF), sob pena do não reconhecimento da
qualidade imunitória. Portanto, não se protegem seitas com inspirações
atípicas, demoníacas e satânicas[10], que incitem a violência, o racismo, os
sacrifícios humanos ou o fanatismo devaneador ou visionário.
De outra banda, o conceito
de templo (do latim “templu”) detém larga amplitude semântica.
A doutrina tem enfrentado dificuldades em reduzi-lo a planos cartesianos,
enquanto a prática tem mostrado uma inaudita expansão das igrejas, frustrando a
tentativa de precisa definição do papel que tais entidades vêm ocupando, de
fato, na realidade hodierna.
Em resumo, pode-se afirmar que
várias teorias tentam traçar o conceito de templo. Em homenagem à
celeridade textual, pedimos vênia para esmiuçar exclusivamente aquela à qual
nos filiamos, na linha da doutrina abalizada[11]: a que prima pela concepção do
“templo-entidade”.
Trata-se de teoria que
conceitua o templo como entidade, na acepção de instituição,
organização ou associação, mantenedoras do templo religioso, encaradas
independentemente das coisas e pessoas objetivamente consideradas[12]. No
sentido jurídico, possui acepção mais ampla que a mera pessoa jurídica,
indicando o próprio “estado de ser” ou a sua “existência”, vista em si mesma.
Nessa medida, o templo-entidade
extrapola, no plano conceitual, o formato da mera universitas
rerum ou da própria universitas juris, aproximando-se
da concepção de organização religiosa, em todas as suas manifestações, na
dimensão correspondente ao culto.
A propósito, o art. 150, § 4º, da CF, oferta subsídios importantes à linha
argumentativa aqui expendida. Observe-o:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias
asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal
e aos Municípios:
§ 4º - As vedações expressas no
inciso VI, alíneas b e c, compreendem somente o patrimônio, a renda e os
serviços, relacionados com as finalidades essenciais
das entidades nelas mencionadas. (grifo nosso).
O grifo no dispositivo
prenuncia a nossa preocupação com um importante detalhe nele inserto, que
ofertará argumentação decisiva para a defesa da imunidade aos templos maçônicos.
É que o artigo 150, § 4º, da CF, que deve ser lido em conjunto com a alínea
b ora estudada, em uma interpretação sistemática, estatui que haverá
desoneração sobre “(...) patrimônio, renda e os serviços relacionados com as
finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas”.
É evidente que a dicção do
comando tem servido para corroborar, entre outros pontos importantes, a ideia
de que o legislador constituinte tendeu a prestigiar a Teoria Moderna, na
esteira de uma interpretação ampliativa, por tratar,
textualmente, do vocábulo “entidade”, chancelando, a nosso ver, a adoção da
concepção do templo-entidade.
Curiosamente, segundo Flávio
Campos[13], o texto constitucional registra o vocábulo
entidade “exatas cinquenta e duas vezes e, em todas elas, emprega-o com este
sentido de ‘instituição’, ‘associação’, ‘organização’”.
A nosso sentir, a concepção
moderna tem-se mostrado a mais adequada à satisfação da problemática que
circunda a tributação dos templos religiosos, que, em virtude do dinamismo que
tem orientado a atividade, com questões jurídicas as mais variadas possíveis,
requerem do exegeta um certo desprendimento das estruturas formais, a fim de
atingir a “ratio legis” e propor a justiça fiscal aos casos concretos. É nesse
contexto que verificamos a clara possibilidade de defesa da imunidade às lojas
maçônicas, o que se provará nos tópicos seguintes.
4. A imunidade religiosa e
as lojas maçônicas
O tema da imunidade religiosa
para as lojas maçônicas é de escasso tratamento na doutrina e na
jurisprudência. Diante do cenário incipiente sobre o assunto, propomos uma
investigação a partir de algumas referências jurisprudenciais.
É que o caso foi tratado, em
mais de uma vez, pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que considerou as
lojas maçônicas “templos”, para fins de imunidade tributária, afastando-se a
incidência do IPTU. Observe os entendimentos:
EMENTA 1: TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. RECONHECIMENTO PELO
PODER PÚBLICO. MAÇONARIA. ENTIDADE RELIGIOSA. A imunidade tributária para as
entidades religiosas, dentre estas as lojas maçônicas, decorre da letra
constitucional e dispensa qualquer procedimento administrativo para que exista
e produza todos os seus efeitos. Apelo provido. Unânime. (APC 5.176.5999,
Relator VALTER XAVIER, 1ª Turma Cível, julgado em 28/06/1999, DJ 09/09/1999 p.
44).
EMENTA 2: EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – MAÇONARIA –
IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – POSSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO
ARTIGO 8º DA LEI COMPLEMENTAR N.º 363/2001. 1. “A maçonaria é uma religião, no
sentido estrito do vocábulo, isto é na “harmonização da criatura ao Criador.” É
religião maior e universal”. (Proc. 2003.0150093525 – APC, Relator ASDRUBAL
NASCIMENTO LIMA, 5ª Turma Cível, julgado em 15/03/2004, DJ 24/06/2004 p. 64)
EMENTA 3: EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – MAÇONARIA –
RELIGIÃO – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – LEI COMPLEMENTAR DISTRITAL – ISENÇÃO –
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – VALOR EXARCEBADO.1. A imunidade é forma qualificada
de não incidência, que decorre da supressão da competência impositiva sobre
certos pressupostos previstos na Constituição. A maçonaria é uma sociedade de
cunho religioso e suas lojas guardam a conotação de templo contida no texto constitucional, devendo, portanto, ficar
imunes aos impostos. (...) (Proc. 2000.0150021228 - APC, Relator SANDRA DE
SANTIS, 3ª Turma Cível, julgado em 03/12/2001, DJ 03/04/2002 p. 38)
No embate processual que marcou
os julgados em epígrafe, notou-se que a Fazenda Pública do Distrito Federal
defendeu a tese de que a loja maçônica não pode ser considerada uma entidade
imune, porquanto as suas salas de reuniões não são “templos”, as reuniões da
maçonaria não são cultos e, ainda, não são religiosas as finalidades da entidade.
Em resumo, a maçonaria não se confundiria com uma religião.
A propósito, outros argumentos
têm sido expendidos na direção contrária à defesa da imunidade para as lojas
maçônicas. Resumidamente, são eles: (I) que os rituais da maçonaria são apenas
“filosofias de vida”, dissociadas do conceito de “divino”; (II) que o fato de
ocorrer acessibilidade restrita às reuniões – o que não é comum aos templos, em
geral – coloca em xeque a subsunção do fato à norma de imunidade; (III) que a
imunidade para a maçonaria é fruto de “achismo”, violador do princípio da
isonomia.
Com a devida vênia, passo a
ofertar o entendimento que reputo plausível, discordando dos argumentos
apresentados.
A análise da questão avoca alta
indagação, cuja complexidade emerge da própria natureza semissecreta ou
sigilosa da maçonaria, o que dificulta o iter a ser trilhado,
na identificação segura da existência do caráter religioso nas lojas maçônicas.
Com efeito, não se mostra
simples a tarefa de definir os contornos procedimentais de uma sociedade
considerada “secreta”, mormente para aqueles não iniciados, como é o caso deste
autor.
Felizmente, a literatura
especializada sobre o tema propicia uma satisfatória “iluminação” sobre o tema,
levando-nos a crer que há, em verdade, um caráter místico-religioso no templo
maçônico.
A nosso sentir, a maçonaria
deve ser considerada, para fins de imunidade tributária, uma verdadeira
religião, à semelhança de tantas outras que harmonicamente coexistem em nosso
Estado laico. Tal identidade se mostra evidente quando a instituição aspira
harmonizar a criatura ao Criador, por meio do sistema sacramental que lhe é
inerente.
O rito litúrgico que imanta as
suas reuniões cerca-se de cerimonial, doutrina e símbolos, sob os quais se
estende a espiritualidade do maçom, que é levado à aprendizagem e ao estímulo
de sua imaginação espiritual.
Se o “culto” é prática que se
destina ao aperfeiçoamento dos sentimentos humanos, e as cerimônias
ritualísticas dos encontros maçônicos visam melhorar o caráter e a vida
espiritual do homem, permitindo-o meditar sobre sua missão e seus valores, não
nos parece prudente dissociar o rito maçônico de culto.
Quanto à tese de que o ritual
secreto viria de encontro ao necessário caráter público de um templo merecedor
da imunidade, não nos parece crível. Em toda liturgia religiosa há mistérios
que serão alcançáveis apenas a alguns, quer porque ocupam posição sacerdotal
privilegiada, quer porque se elevam na fé. Aliás, é da natureza das religiões o
seu alto grau de esoterismo. Na História Antiga, nem todos se aproximavam das
divindades, mas apenas os faraós e sacerdotes. Entre os gregos, o conhecimento
do “divino” era segregado a alguns iniciados. Os índios, em seus rituais
místicos, enaltecem o “transcendente”.
Nesse passo, não vejo o caráter
secreto da maçonaria como inibitório da configuração de “templo”, por acreditar
que o esoterismo é atributo imanente de qualquer religião.
É fato que tais argumentos
passam ao largo do plano jurídico, o que, em tese, enfraqueceria a sua
robustez. Entretanto, a defesa da imunidade aos templos pode ser empreendida
com o apoio do texto constitucional.
Se partirmos da ideia de que o
templo é “entidade” e, portanto, uma instituição ou organização que deve ser
encarada independentemente das coisas e pessoas objetivamente consideradas,
perceberemos que sua dimensão extravasa o parâmetro da “universitas rerum”,
aproximando-se do próprio “estado de ser”, da “existência humana”, analisados
na essência.
No ideal de bem conceituar o
“templo”, evita-se a sua “coisificação”, que leva ao amesquinhamento da norma;
enaltece-se o transcendental propósito eclesiástico, na busca da certificadora
“mens legislatoris”.
Ainda que saibamos que a loja
maçônica não se mostre como “igreja”, no sentido restrito do termo, não se pode
afastar dela o contexto de religiosidade. Aliás, o dispositivo constitucional
não imuniza “igreja”, mas o templo, em sua perspectiva axiológica, e não em um
predeterminado “standard” ou formato estereotipado. Tem-se o templo na medida
em que se busca, em seus rituais, o caminho superior da fé, da crença em Deus,
na perquirição do aperfeiçoamento espiritual do homem. É o templo, em verdade,
uma organização, nas mais diferentes manifestações, desde que se prenda à
dimensão correspondente ao culto.
Não se pode perder de vista que
o conceito de religião é aberto, inexistindo um regramento legal ou
constitucional. Vale dizer que a conceituação de religião, longe de ser
substancial – em que se perscruta aleatoriamente o elemento conteudístico –,
deverá ser funcional, abrindo-se para quaisquer agrupamentos litúrgicos
em que os participantes se coobriguem moralmente a agir sob certos princípios.
Nessa medida, o intérprete deve buscar o sentido mais abrangente, sob pena de
colocar em risco as crenças ou associações de grupos minoritários[14].
5. A isenção de IPTU para
as lojas maçônicas
Na linha da desoneração de
impostos das lojas maçônicas, o legislador infraconstitucional tem procurado
decididamente estatuir o que a Lei Maior deixou para o campo da interpretação.
Não são incomuns as leis de isenção do IPTU, reforçando a tese de que tais
entidades, à semelhança dos templos religiosos, são merecedoras do beneplácito
estatal.
Cite-se, em tempo, o parágrafo
único do artigo 8º da lei Complementar n.º 277, de 13 de janeiro de 2000,
acrescido pela Lei Complementar n.º 363, de 19 de janeiro de 2001, ambas do
Distrito Federal, que prevê a isenção de IPTU para imóveis construídos e
ocupados por “templos maçônicos”. É curioso observar que o legislador
distrital, ao dispor sobre a indigitada isenção de IPTU para as lojas maçônicas,
referiu-se textualmente a estas como “templos religiosos”. Note o artigo
mencionado:
“Ficam isentos do pagamento do
imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU os imóveis
construídos e ocupados por templos maçônicos e religiosos, de
qualquer culto, ficando remidos os respectivos débitos inscritos e não
inscritos na dívida ativa, ajuizados e por ajuizar”. (grifo nosso)
6. Conclusão
Num cenário de proliferação de
templos, o qual estamos presenciando nos últimos anos, em vários países do
mundo, somos instados a refletir criticamente sobre a extensão do fenômeno e
suas consequências.
Negar a imunidade às lojas
maçônicas e permitir a benesse a alguns que tendem a burlar a norma
constitucional é evidente paradoxo. Tem-se notado o cenário fraudulento em que
se inserem, sob a capa da fé, algumas “pseudoigrejas” que, difusoras de uma
religiosidade hipócrita, chegam a mascarar atividades ilícitas sob a função de
“representantes do bem”. De fato, tem sido corriqueira a divulgação na Imprensa
de casos retumbantes, em que certas entidades religiosas realizam negócios
ilícitos, valendo-se da imagem puritana que a atividade naturalmente impinge.
Diante desse expressivo
crescimento das igrejas, nos tempos hodiernos, é importante tecermos alguns
comentários finais, ainda que o dito popular nos ensine que “religião é tema
que não se discute”, em razão do fato de que o consenso nesse assunto é
praticamente inviável.
A imunidade religiosa é norma
sublime que permite garantir a intributabilidade das religiões, entretanto, a
nosso sentir, esvazia-se, na essência, quando se pretende amesquinhá-la. O
conceito de religião é aberto, não sendo facultado ao exegeta fechá-lo,
hermeticamente, a seu talante, em pura vaidade interpretativa. Se há um
agrupamento litúrgico com difusão comum de princípios morais, será possível
enquadrá-lo como entidade religiosa para fins de imunidade. Se não se apresenta
como “templo” na forma, sê-lo-á na essência.
Posto isso, a maçonaria é, sim,
uma sociedade de cunho religioso, e suas lojas guardam a conotação de templo,
contida no texto constitucional, devendo, portanto, ficar
imunes aos impostos, em prol da liberdade religiosa que marca o ordenamento
constitucional doméstico.
Eduardo Sabbag: Advogado; Doutorando em Direito Tributário na
PUC/SP; Mestre em Direito Público e Evolução Social pela UNESA/RJ; Professor de
Direito Tributário e de Língua Portuguesa na Rede de Ensino LFG; Coordenador e
Professor do Curso de pós-graduação, em Direito Tributário na Rede de Ensino
LFG.
Autor das obras:
Manual de Direito Tributário
pela Editora Saraiva;
Elementos de Direito Tributário, 11ª edição; Prática Tributária, 3ª
edição; ambas pela Editora Revista dos Tribunais; Redação
Forense e Elementos da Gramática, 3ª edição; Repertório de
Jurisprudência de Direito Tributário, 4ª edição, ambas pela Editora Premier Máxima.
[1] SABBAG, Eduardo de
Moraes. Manual de Direito Tributário, São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 277-297.
[2] V. TORRES,
Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro, tributário: Os
direitos humanos e a tributação. Imunidade e Isonomia. V. III, RJ: Renovar,
1999, p. 238.
[3] V. TORRES,
Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro, tributário: Os
direitos humanos e a tributação. Imunidade e Isonomia. V. III, RJ: Renovar,
1999. P. 238.
[4] Ibidem, p. 240.
[5] Ibidem, p.
239.
[6] V. TORRES,
Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro, tributário: Os
direitos humanos e a tributação. Imunidade e Isonomia. V. III, RJ: Renovar,
1999. P. 239.
[7] ICHIHARA, Yoshiaki.
Direitos Tributários, 7ª ed., São Paulo: Atlas, 1998, p. 240.
V. RE
129.930/SP, 2ª T., rel. Min. Carlos Velloso, j. Em 07-05-1991.
[9] V. TORRES,
Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro, tributário: Os
direitos humanos e a tributação. Imunidade e Isonomia. V. III, RJ: Renovar,
1999, p. 244.
[10] V. SARAIVA
FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. A Imunidade Religiosa, in RDDT,
nº 4, ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.), janeiro de 1996, p. 61.
[11] Como defensores dessa
concepção, aproximam-se José Eduardo Soares de Melo, Marco Aurélio Greco, Celso
Ribeiro Bastos, entre outros. A ratificar a citação dos doutrinadores, vide CAMPOS,
Flávio. Imunidade Tributária na Prestação de Serviços por Templos de Qualquer
Culto. In Revista Dialética de Direito Tributário nº 54,
ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.), março de 2000, pp. 44-53 (p. 50).
[12] V. SILVA,
De Plácido e. Vocabulário Jurídico, 27ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.
533
[13] CAMPOS, Flávio.
Imunidade Tributária na Prestação de Serviços por Templos de Qualquer
Culto. In Revista Dialética de Direito Tributário nº 54,
ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.), março de 2000, pp. 44-53 (p. 48).
[14] V. TORRES,
Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro, tributário: Os
direitos humanos e a tributação. Imunidades e Isonomia. V. III, RJ: Renovar,
1999, p. 241.
Direito Tributário I - v.42
Eduardo Sabbag
Português jurídico - v.52
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