sexta-feira, 8 de maio de 2020

MAÇONARIA E REDES SOCIAIS





As redes sociais se constituem em hábito presente na vida de todos nós, atraindo

 cada vez mais e mais usuários, especialmente entre jovens já nascidos na era da mobilidade digital. Não se trata de “modismo”, mas de comportamento
 definitivamente incorporado na vida de um número cada vez maior de 
pessoas. Criou-se uma espécie de dependência dessa forma de interação
 interpessoal, não presencial e imediata. Em qualquer lugar e com apenas 
um clique pode-se entrar em contato com uma, várias ou centenas de pessoas.
Recente publicação de “O Globo” (1) dá conta de pesquisa feita na Universidade
 de Pittsburgh, com quase dois mil adultos americanos de idade entre 19 e 
32 anos, revelando que quanto mais tempo as pessoas passam navegando
 por plataformas como Twitter, Facebook, Istagram, Linkedln, Whatsapp e 
outras, maiores são as chances de elas experimentarem uma sensação de 
isolamento social.
Esse é um fenômeno observado desde a década de 1.990, quando
 estudos começaram a constatar o chamado “paradoxo da Internet”, 
ou seja, a contradição entre a extrema facilidade e de se manter contato 
virtual com tanta gente, por intermédio das redes, e a “ausência real 
de contato humano”. Ou seja: mais tempo “on-line”, menos tempo no mundo real.
É compreensível, mesmo ao leigo, essa relação direta entre o aumento do
 uso da Internet e o isolamento. Algumas pesquisas constataram que essa
 prática também aumenta a sensação de angústia, ansiedade, inveja,
 frustração e estresse, o que torna a coisa toda um problema de saúde. 
Contudo, as conclusões desses estudos também apontam para o fato de
 que os malefícios advindos do uso das redes dependem da forma como os
 usuários se envolvem com essas plataformas. O que se poderia afirmar, com
 alguma segurança, é que, se alguém utiliza as redes para estimular e 
aumentar contatos reais com outras pessoas, isso será sempre saudável, 
do ponto de vista individual e social.
De todo modo, essa não é uma questão simples. Ao contrário, é complexa
 demais para ser tratada neste artigo, mesmo porque o mérito dessa questão
 não é o objetivo ora proposto. Também não se cogita, aqui, do uso das 
mídias nas relações institucionais, pois, neste ponto, a Ordem e sua 
estrutura organizacional se utilizam das ferramentas e tecnologias como
 qualquer outro empreendimento, público ou privado.
O que realmente interessa, neste artigo, é fazer algumas reflexões sobre o 
uso das redes sociais pelos maçons, enquanto irmãos, e as suas relações
 com a vida maçônica e, destacadamente, confrontar com as tradições da 
fraternidade e da existência necessária da Loja Maçônica, como centro
 de união e lugar de “encontro real” entre seus obreiros.
Nesse sentido, deve-se reconhecer, desde logo, o aspecto positivo que 
as redes sociais proporcionam à fraternidade maçônica, dada a rápida 
interação dos irmãos entre si e com as atividades da sua Loja e fora dela. 
Isso vale especialmente nas grandes cidades, onde a mobilidade urbana é 
fator que sempre dificulta encontros presenciais, os quais, por isso mesmo – 
e quase sempre –, acabam por se restringir às sessões maçônicas, ordinárias 
ou não, e eventos importantes organizados pela Loja no plano maçônico, 
familiar ou social.
Em algumas plataformas, como é o caso do Whatsapp, essa facilidade de
 interação, para além do contato individual, apresenta pelo menos 
duas outras vertentes bastante comuns entre os membros de uma mesma 
oficina: a) um grupo específico para tratar exclusivamente de assuntos
 afetos à administração da Loja e do seu quadro de obreiros; e,
 b) um ou mais grupos onde os irmãos postam livremente aquilo que 
lhes parece oportuno, dentro do espírito para o qual esse determinado
 grupo foi criado. Nestes últimos, a boa camaradagem e mesmo o bom 
humor são fatores importantes para agregar e manter presente o espírito
 daquela fraternidade em particular.
Óbvio que as observações feitas acima não esgotam as possibilidades de uso 
de tais redes pelos irmãos de uma Oficina, pois não raro se expande e pode
 interessar a outros tantos membros de outras tantas Lojas, independentemente
 de suas respectivas Potências, sejam elas nacionais ou não. Nesse amplo
 espectro, não seria de todo equivocado reconhecer que as redes 
sociais, assim utilizadas por maçons, poderiam reafirmar, na prática, aquele
 princípio de “universalidade da instituição maçônica”, bem como o
 sentimento de “pertencimento a uma grande família”, cujos membros, 
em comum, cultivam os mesmos rituais, valores e tradições.
Está claro, também, que as redes sociais propiciam novos espaços e 
possibilidades na comunidade maçônica. Além disso, podem, ainda, ser 
utilizadas para incrementar novas metodologias na produção de atividades
 culturais e na elaboração de trabalhos doutrinários ou filosóficos, tudo 
dependendo, apenas, da criatividade dos irmãos que busquem empregá-las
 de forma inteligente.
Nesse sentido, a Loja Harmonia e Trabalho, 222 iniciou interessante
 experiência no campo da produção maçônico-cultural, criando grupos 
de whatsapp e de e-mail, para propor e desenvolver pesquisas sobre
 temas específicos (História da Maçonaria, Filosofia, Simbologia, Doutrina, 
Ritualismo, Práxis maçônica, ou mesmo de comentários de lições dos diversos 
graus). Cada grupo conta com seu respectivo coordenador, mas o planejamento da pesquisa e a divisão de tarefas são previamente definidos, de forma
 que cada um contribua com a parte da pesquisa que lhe cabe e apresente
 suas conclusões para debate com os seus pares. A facilidade está em 
que a apresentação e desenvolvimento dos temas são apresentados, pela 
mídia, aos demais participantes do grupo, para análise, comentários e discussão,
 até a formatação do texto final. Com isso, as ideias são 
ordenadamente desenvolvidas, debatidas e compartilhadas por todos,
 coisa que seria bem mais difícil, caso se tivesse de marcar reuniões presenciais
 com os integrantes, para apresentação de resultados e o necessário debate
 antes da conclusão do trabalho.
Enfim, mediante essas metodologias, as redes podem ser mais um
 importante elemento de integração entre os irmãos, em torno da valorização
 da cultura maçônica, preparando ambiente pedagógico para aqueles que 
vierem a compor futuramente os quadros da Loja. Desnecessário 
dizer que isso melhor orientará as ações do mundo profano, 
com base no conhecimento mais aprofundado dos princípios da nossa
 Sublime Instituição.
Certamente, essa ideia não é original e deve estar sendo explorada algures.
 Entre-tanto, o que importa encarecer é o fato de que essas novas
 metodologias e ferramentas virtuais se constituem, também, em mais um
 estímulo para aprofundar os conhecimentos da fraternidade, a par dos tantos
 outros métodos tradicionais e ritualísticos que fazem parte da própria
 essência evolutiva do ensinamento maçônico.
Para encerrar estas reflexões, cumpre retornar às considerações iniciais
 acerca da relação, observada por especialistas, entre o uso das redes 
sociais e o isolamento social. De fato, as redes aproximam as pessoas, mas, 
como isso ocorre de forma virtual, acaba comprometendo o 
envolvimento real e afetivo, se mantido apenas naquele nível superficial.
As redes vieram para ficar e são úteis e práticas para manter contatos 
com velhos e novos amigos, com colegas de trabalho ou com pessoas 
que sequer conhecemos pessoalmente, tornando tudo e todos mais próximos
 de nós como jamais estiveram. “Porém estamos ajudando menos aqueles
 que são próximos de nós, não sabemos nomes de vizinhos e pessoas
 com as quais convivemos, nossa rede de relação (física) cai vertiginosamente
 quando ainda temos 20 anos (idade considerada como auge da juventude). 
Em suma estamos nos distanciando daqueles que estão perto para nos 
aproximarmos daqueles que estão longe.” (2)
Neste contexto, impossível não cogitar e reafirmar a existência necessária 
da Loja Maçônica, enquanto “tempo e lugar” de encontro entre 
irmãos para aprofundarem, entre si, o conhecimento recíproco, como 
seres humanos iniciados na Arte Real. Definitivamente, não se concebe 
Maçonaria tradicional sem o “tempo-espaço” da Loja, onde os maçons se 
congregam e trabalham ritualisticamente. Por isso as Obediências 
reconhecidas internacionalmente como regulares advertem que, embora
 haja sites nesse sentido (Fake Masonary(3) , ninguém poderá ingressar
 e participar da Maçonaria pela via da internet, pois todo o processo é
 pessoal e exige a presença tanto na iniciação, quanto nas reuniões da Loja. (4)
A essência da Maçonaria é aproximar os “seres humanos”, condição para
 construir uma fraternidade. Por isso, os primeiros artigos das Constituições 
dos Fraco-Maçons, de 1.723, prescreveram a tolerância como virtude 
elementar e necessária entre pessoas que professam religiões, filosofias 
e ideias políticas diversas. A Loja tem sido, desde então, o lugar onde os 
maçons se encontram e superam suas diversidades pessoais, porque se 
reconhecem simplesmente como seres humanos. Esse é o motivo 
pelo qual a Maçonaria há de se tornar o CENTRO DE UNIÃO e meio de 
conciliar, por uma amizade sincera, pessoas que teriam, perpetuamente, 
permanecido separadas.(5) Essa noção de encontro, que a Loja proporciona
 aos seus obreiros, é absolutamente fundamental para a existência da 
Maçonaria. É preciso estar presente, física e espiritualmente, nas reuniões 
maçônicas, porque é o encontro com outro ser humano que propicia a 
possibilidade de um aprendizado sobre nós mesmo. Nesse sentido, a 
melhor e mais profunda justificação que jamais ouvi sobre a verdadeira 
essência da Maçonaria talvez esteja nas palavras de Leo Apostel, quando 
afirma que:
Os Seres humanos, basicamente diferentes – i.é, diferentes social e 
psicologica-mente, ideológica e emocionalmente – tentam encontrar-se 
em nível de intimida-de, fora da sociedade civil, em um grupo fechado.
 Estas pessoas chamam a si mesmas de Maçons e utilizam vários rituais e 
mitos como instrumentos de suas reuniões. (6)
E essas pessoas se reúnem para uma reeducação, baseada na redução
 do conhecimento ao puramente humano, para depois retornar ao convívio 
social com um sentimento de compreensão muito mais rico e fecundo. 
Essa interação é elementar, porque só é possível relacionar-se com 
outro quando aprendo a me conhecer e, vice-versa, aprendo mais sobre 
mim mesmo ao relacionar-me com o outro. É em presença dos irmãos,
 sob seus olhares, movimentos, ações e palavras que recebo suas
 ideias e sou influenciado por elas. Mas isso não retira de mim a minha 
liberdade e a minha individualidade. Aprimora-me!
A Loja Maçônica foi, é e sempre será o “espaço” e o “momento” para os 
maçons se encontrarem, física e espiritualmente, cultivando suas tradições
 obreiras, utilizando-se de práticas rituais, símbolos e mitos, como
 instrumentos de aperfeiçoamento moral e social. Em Loja, cria-se o ambiente
 propício para encontrar respostas que existem em cada um e em todos nós e,
 assim, evoluir enquanto seres humanos.
E isto, jamais será possível por outra via que não seja presencial, real e
 não virtual. Aqui, a internet e redes sociais são inócuas e nunca poderão 
substituir a verdadeira iniciação e prática maçônicas. Por essa razão, 
a Maçonaria e nossas Lojas regulares são, igualmente, um porto seguro
 na atualidade, porque é da sua própria essência que haja o encontro pessoal, 
real e afetivo entre aqueles iniciados em seus mistérios, em oposição 
ao isolamento social, a ansiedade e estresse, que o exagerado uso
 das redes sociais possam eventualmente causar.




Notas:

2 – Cf. interessante artigo em <https://www.blink102.com.br/redes-sociais-e-o-isolamento-social>
3 – Cf. http://www.masonicinfo.com/fakemasonry.htm4 – Cf. http://www.masonicinfo.com/grandlodges.htm5 – Cf. Constituições dos Francos Maçons ou Constituições de Anderson de 1723, Ed. Fraternidade, SP – 1982, pag. 50.6 – A Maçonaria – Um ensaio filosófico, Ed. Maç. ”A TROLHA” 1ª. ed., 1989, Londrina/PR, p. 11

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